Ora aqui está uma opinião que vale a pena ler (a única que, entre tantas outras, eu acho que vale mesmo a pena...):
"Eu não sei o que se passou na praia do Meco há 40 dias,
mas devo ser um dos poucos cidadãos portugueses que o afirma sem
reservas. Eu não sei se as praxes tiveram alguma coisa a ver com a morte
de seis jovens universitários, mas muita gente à minha volta parece
saber. Comentadores insuspeitos de arroubos mediáticos como Pacheco
Pereira ou Vasco Pulido Valente discorreram sobre as praxes com se elas
fossem o caminho direto para a degradação da juventude. E eu, uma vez
mais, não sei se serão.
Sei que há praxes violentas e praxes engraçadas. Sei
que há praxes humilhantes e praxes apenas risíveis. Sei, sobretudo, que
no mundo esterilizado e assético a que a maioria parece aspirar, não há
lugar para a folia, para o exagero, para a caricatura, para a troça. As
praxes também são isto, como o Carnaval (festa que não é da minha
simpatia) também é. Como na Idade Média mais funda, hoje o riso parece
voltar a ser subversivo.
Eu nunca participei numa praxe nem nunca usei capa e
batina, porque isso eram coisas de Coimbra. Em Lisboa, na Universidade
de Lisboa, nada disso existia no meu tempo. Porém, a praxe e a capa e
batina em Coimbra têm uma história que quem lá andou conhece melhor do
que eu. A capa destinava-se a ocultar a proveniência regional e
diferenças classistas entre os estudantes. A praxe era uma espécie de
iniciação integradora dos mais novos (recém-chegados) pelos mais velhos.
Nada disto tem alguma coisa de mal. Há praxes
militares; há praxes em clubes e associações e nas mais diversas
profissões. Havia praxes nas redações de jornais. O mal foi a boçalidade
que certas faculdades e Universidades permitiram. Ontem, o ex-diretor
da Faculdade de Direito da Universidade Católica do Porto e
ex-presidente da ERC, Azeredo Lopes, escreveu no Facebook que aplicara
restrições às praxes de tal forma que qualquer abuso das regras
resultava em expulsão. Fez bem. É exatamente isto, e não as praxes em
si, que se deve combater.
Mas nesta sociedade de manada e histeria (em certo
sentido todas as manadas são histéricas e todas as histerias funcionam
em manada) confunde-se tudo. Reparemos no tanto que já foi escrito e
dito sobre o assunto; quase não há lugar para dúvidas. Desconfiava-se de
um rapaz de quem se dizia que tinha amnésia e seria o Dux Veteranorum
das praxes. Afinal, revela ontem a edição semanal do Expresso, esse
mesmo rapaz foi salvo pela Polícia Marítima num estado de
pré-afogamento. Afinal não tem amnésia nenhuma e fontes da PJ (o
processo já está no célebre segredo de justiça de forma a se poderem
dizer as maiores enormidades sem contraditório) dizem que será chamado
em breve à investigação. A PGR diz que ainda nenhuma família se
constitui assistente (ou parte acusatória) do processo.
Mas as praxes, sejam elas quais forem, já são
apelidadas de fascistas, de assassinas, de abjeções, de tudo! Isto é um
país que há de ir do 8 ao 80, sem que quase ninguém reflita um milésimo
de segundo sobre o significado das coisas. Há razões para haver praxes,
ou pode haver (embora pessoalmente não simpatize com a coisa); há praxes
que deviam ser proibidas pelas universidades e pela lei. Não por serem
praxes, mas por serem atentados à dignidade ou à liberdade dos alunos. É
apenas isto que está em causa, no caso das mortes do Meco terem alguma
em concreto a ver com as praxes.
Porque é isso que não se sabe, embora seja isso que todos discutem"
Henrique Monteiro