Dizer a um doente que não há nada a fazer contra o cancro que o escolheu como vítima. Dizer-lhe que a doença está a avançar mais depressa do que os dias e que, até poderíamos tentar a quimio, mas que o melhor seria tratar os sintomas paliativamente e esperar... e ainda assim, termos a perfeita noção de que há uma parte daquela pessoa que temos à nossa frente que não compreende ou não quer acreditar no que está a ouvir. Então, questiona-nos acerca de cirurgias, de tratamentos que não a vão salvar... questiona tão sofregamente, tão alheia a tudo o que lhe está a ser dito, completamente inebriada pela esperança ou por um instinto primitivo de sobrevivência.
A certa altura, não consegui perceber se estava na presença de alguém na posse plena das suas capacidades ou na presença de um bichinho ferido que tentava, a todo o custo, fugir para longe...
Como nós ficamos diferentes quando temos a noção da nossa finitude. Julgamos ter plena consciência de que um dia nos vamos embora e que não vamos passar de uma história que um dia será esquecida... mas não é verdade. Nós vivemos com essa pequena sombra que paira sobre nós, mas que é tão discreta que, provavelmente, na maior parte das vezes nem nos damos conta da sua presença (e ainda bem que assim é!).
Enquanto vivemos somos eternos; somos um passado, um presente e, sobretudo, somos um futuro, um amontoado de sonhos e de desejos por realizar. Não imagino dor maior do que aquela de não poder planear a longo prazo, de saber que vamos ter menos tempo do que aquele que tínhamos previsto...
Como as coisas seriam diferentes se soubéssemos que expirávamos dentro de alguns meses. Eu tenho perfeita noção de que faria imensas coisas de forma diferente e, ainda assim, não sei se isso implicaria fazê-las de melhor forma; mas faria de forma diferente.
Inté*